sábado, 23 de novembro de 2013

Modern Family, não tão moderna assim

Seguindo o estilo mockumentary (famoso em The Office), Modern Family é uma Sitcom que conta histórias sobre a famiília de Jay Pritchett, sua filha Claire Dunphy e seu filho Mitchell Pritchett que vivem em Los Angeles. Claire é uma típica dona de casa americana casada com Phil Dunphy e o casal tem três filhos. Jay é casado com uma colombiana, Glória, muito mais jovem que tem um filho pré-adolescente, Manny. Mitchell é casado com Cam, e eles adotaram uma bebê vietnamita chamada Lily. 

Modern Family retrata de forma cômica e inteligente alguns tipos de familias contemporâneas como, por exemplo, as famílias gays e as famílias reconstituídas. Além disso, discute temas associados à construção e manutenção desses novos núcleos: dificuldades de conciliar os papéis familiares com a carreira profissional, importância central das relações afetivas, aceitação das escolhas dos filhos, adoção, preconceito familiar, problemas da adolescências, o divórcio, diferenças de idade e implicações na formação de vínculos sociais e amorosos, etc.
 

No décimo terceiro episódio da primeira temporada da série, Phill tenta explicar para Claire como usar o controle remoto do home theater. Ela apresenta dificuldades para usar qualquer forma de tecnologia e é completamente dependente de Phil. 

A série constantemente desafia e questiona os papéis de gênero na família, no entanto, o episódio “Fifteen Percent” reafirma diferenças entre as figuras masculinas e femininas, ressaltando o domínio de Phil (figura masculina) através do uso da tecnologia. Claire destrói o controle remoto, pois fica frustrada ao perceber o poder que Phil tem sobre ela.



Após ouvir as desculpas dissimuladas de Claire, Phil decide comprar outro controle remoto. Ele ainda a provoca, dizendo que ensinará o filho dele menos inteligente, Luke, a utilizar o aparelho em 20min. Claire defende Luke, mas de uma forma inesperada. Ela parece não discordar de Phil sobre a inteligência do menino, mas diz que ele – talvez por ser menino – entende de eletrônicos. Então ela propõe outro desafio: “Haley, ensine ela a usar o controle remoto que eu me desculpo de verdade”,

O posicionamento de Claire e Phill pressupõe uma ideia: mulheres são boas em taferas domésticas, enquanto os homens são bons em tarefas que envolvem raciocínio e uso de tecnologias.

E isso é verdade?

 Homens e mulheres apresentam diversas diferenças: distribuição de cromossomos celulares, anatomia das cordas vocais, largura da bacia, quantidade de suor e lágrimas produzidas, Igualdade entre os sexos, ao pé da letra, nunca existiu. Em primeiro instante, o sexo cromossômico de uma pessoa só se manifesta no embrião entre a sétima e a décima semana de vida. Até então, menino e menina se parecem. Mas, nesse período, o cromossomo Y faz com que certos tecidos, cuja tendência seria formar ovários ou glândulas sexuais femininas, se transformem em testículos, as glândulas sexuais masculinas. Uma pequena produção de hormônios no feto de alguma maneira deixa no cérebro uma marca (ainda não localizada) que o faz trabalhar ou à maneira masculina ou feminina.

A pergunta é se essa diferença no trabalho cerebral poderia implicar em diferenças cognitivas entre homens e mulheres. Os meninos se dão melhores em cálculos? Meninas são mais bem sucedidas na comunicação em linguagem? Por que há menos mulheres do que homens trabalhando como cientistas ou engenheiros? Aptidão genética ou cultura?

Há diversos estudos sobre o assunto, os mais poderosos são aqueles que fazem meta-análises. Janet Shibley Hyde e colaboradores, da Universidade de Wisconsin compilaram mais de 10 anos de estudos sobre o tema. Os cientistas concluíram que os sexos são mais semelhantes do que diferentes. Embora existam diferenças em habilidades cognitivas específicas, não há evidências significativas de diferenciação cognitiva entre os sexos, com relação à inteligência geral.

Esses resultados mostram quão equivocada pode ser a visão de que os homens são superiores às mulheres, mesmo na hora de manipular um dispositivo eletrônico. Ambos os sexos apresentam a mesma capacidade de resolução de problemas. As diferenças observadas não estão relacionadas a essa capacidade geral e sim a determinadas habilidades de operar com informações de natureza diversa. Além disso, alguns autores sugerem que, mesmo nas habilidades específicas, as diferenças entre homens e mulheres estão se estreitando com o passar dos tempos. Pueyo e Zaro mostram que em um período de 10 anos as diferenças nas capacidades viso-espaciais, com relação ao sexo, diminuíram.

Em Modern Family, o desafio de ensinar tecnologia parece não depender da inteligência para Claire, mas ao sexo daquele que aprende - ela desafia Phil a ensinar sua filha e não seu filho. A tecnologia é estabelecida como algo que os homens são mais bem sucedidos do que as mulheres. Apesar de ao longo da série as filhas do casal serem vistas utilizando tecnologia – principalmente smartphones, o episódio sutilmente afirma que as mulheres devem ser ensinadas pelos homens para usar de forma correta as tecnologias. Phil não lê manual, não procura vídeos tutoriais no You Tube, simplesmente sabe mexer no controle remoto. É um talento inato! Pode ser engraçado esse fato, mas não há nada de moderno nessas ideias.


Referências

Andrés-Pueyo, A.& Zaro, M.J. (1998). La Inteligencia de los Hombres y las Mujeres. Mundo Científico, 192: 63-77.
Hyde, J.S., Fennema, E., & Lamon, S. (1990). Gender differences in mathematics performance: A meta-analysis. Psychological Bulletin, 107, 139-155.
Hyde, J.S. (2005) The gender similarities hypothesis. American Psychologist, 60(6), 581-592.
Spelke, Elizabeth S. (2005). Sex differences in intrinsic aptitude for mathematics and science?: A critical review. American Psychologist, 60(9), 950-958.

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